A arqueologia mostrou-nos que a utilização da folha da coca é já muito antiga, tendo sido encontrados vestígios do seu consumo no Equador e no Peru datados de 2500 A.C.. A planta Erythroxylon Coca tem origem na América do Sul, nas regiões altas dos Andes. Foram os índios bolivianos Aymara, conquistados pelos Incas no século X, que começaram a utilizar a palavra “coca” que significa “planta”. Nos séculos XII e XIII, a coca deu origem a inúmeros confrontos, até que os Incas, em 1315, conseguiram o seu monopólio. Para este povo, a coca era uma planta medicinal e sagrada, incluída, por isso, em rituais religiosos, profecias, casamentos, funerais e nos rituais de iniciações de jovens nobres (“haruaca”). No entanto, a sua utilização não era generalizada, sendo apenas acessível à elite Inca.
Com a descoberta da América, começam a surgir atitudes contraditórias face à coca. Se por um lado a Igreja proibe a sua mastigação, com o intuito de abolir um vício pagão, por outro, quando percebe os benefícios que poderia retirar da manutenção do seu consumo, permite que os índios trabalhassem sob o seu efeito. Um édito de Filipe II de Espanha legaliza o uso da coca, generalizando-se o consumo a toda a população nativa. A coca chega mesmo a tornar-se um substituto da comida. Neste seguimento, multiplicam-se as referências ao consumo de coca por viajantes e cronistas, que lhe atribuem benefícios medicinais e estimulantes. Apesar disso, os espanhóis não exploram comercialmente este produto, ao contrário do que aconteceu com o tabaco e o quinino.
Em 1580, Monardes descreve a planta da coca pela primeira vez. No entanto, esta continua a ser exclusiva da América do Sul. Só em 1750 é que são enviadas as primeiras plantas para a Europa pelo botânico Joseph Tussie.
Em 1858, Nieman e Wolter isolam o princípio ativo responsável pelos efeitos da planta, a cocaína, tendo o interesse por esta substância aumentado a partir desta altura. Foi inicialmente usada como medicamento, após foi rapidamente comercializada em grande escala, passando a ser constituinte de vários produtos como o vinho tónico de Angelo Mariani (Vin Mariani), remédios caseiros ou mesmo da Coca-Cola (o que se verificou durante 17 anos). A cocaína passou a ser o remédio de eleição para quase todas as doenças. Personalidades como Sir Arthur Conan Doyle (criador do famoso detetive Sherlock Holmes), Júlio Verne, Thomas Edison, o Papa Leão XIII, Rei William III, Alexandre Dumas, R. L. Stevenson e por aí adiante, tornam-se seus convictos defensores.
Freud, após a ter experimentado e feito a revisão da literatura disponível sobre o assunto, contribui para provar a sua função de anestésico local, recomendando-a inclusivamente para problemas como a depressão, perturbações digestivas, asma, estimulante, afrodisíaco, etc. A medida que se vão observando os efeitos negativos do consumo de cocaína e após a publicação sobre "heroinomania" de Louis Lewin, Freud (1885) reformula a sua posição e começa a trabalhar o conceito de toxicomania, publicando também os "apontamentos sobre a ânsia de cocaína". Entre 1885 e 1890, a literatura médica apresenta mais de 400 relatos de perturbações físicas e psíquicas devido ao consumo desta subtância. Dado que muitos deles se referiam a pessoas a quem tinha sido administrada cocaína como antídoto para a morfinomania, as duas drogas (cocaína e morfina), apesar de possuírem efeitos muito diferentes, começam a ser confundidas e regulamentadas, a nível internacional, de igual forma.
O recurso à cocaína como anestésico local em cirurgia ocular e otorrinolaringológica generalizou-se, tendo sido, mais tarde, substituída por equivalentes mais seguros.
De uma forma mais acentuada nos anos 20, verificou-se nos países ocidentais uma grande surto no consumo de cocaína por aspiração nasal. Foram necessárias medidas de controle internacionais e a Segunda Guerra Mundial para que a magnitude desta epidemia começasse a sofrer uma redução. Até aos anos 70, o consumo manteve-se bastante marginal, altura a partir da qual a cocaína começou a ser associada à imagem de êxito social (nos Estados Unidos). Tal fato, voltou a acentuar o consumo, que se generalizou às diferentes classes sociais e teve forte aceitação entre consumidores de outras drogas como a heroína, álcool ou anfetaminas, tornando-se num grave problema de saúde pública.
No nosso país, os anos 80 marcam o aparecimento da cocaína no mercado negro. Inicialmente uma droga de elite, rapidamente sofreu uma banalização e generalização do seu consumo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário